domingo, 2 de maio de 2010

O MARKETING E O REDUCIONISMO – A NECESSARIA REFLEXÃO

Escrever sobre Marketing, um dos reinos da interdisciplinaridade, é instigante, pois em sua essência encontram-se perspectivas diversas, dentre as quais o Marketing pode ser visto como um estado de espírito, uma filosofia que orienta o pensamento geral da organização tanto nas decisões, quanto na implementação destas; uma maneira de organizar as várias funções e atividades das organizações; um conjunto de ferramentas, técnicas e atividades a que os clientes e outros públicos estão expostos.

Marketing é estabelecer, manter e desenvolver relacionamentos de longo prazo com os públicos de interesse, consumidores e outros parceiros, afim de que os objetivos das partes sejam atendidos. Isto pode ser alcançado através de trocas mútuas e do cumprimento das promessas estabelecidas; os recursos da empresa vendedora - pessoas, tecnologia e sistemas - têm que ser utilizados de forma que a confiança do cliente nos recursos envolvidos e, portanto, na própria organização, seja continuada e ampliada.

Há diversas tendências no Marketing, dentre elas a busca pela qualidade, valor e satisfação do consumidor; pela construção de relacionamentos e retenção de clientes; pelo gerenciamento de processos e integração de funções; pelo pensamento global e planejamento de mercado local; pelas alianças estratégicas e networks; pelo Marketing direto e on line; pelo Marketing de serviços; pelas indústrias de alta tecnologia; e de modo especial, pelo Marketing ético, respeito aos direitos do consumidor e responsabilidade sócio-ambiental.

O Marketing visa a criação de valor, quando direciona seus esforços para promover produtos, serviços, pessoas, lugares, causas e organizações. Este valor superior é obtido pela satisfação e prazer para o cliente, fidelidade e relações duradouras e lucrativas.
Pode-se afirmar que as ações do Marketing caminham paralelas e alinhadas com as intenções estratégicas das organizações. Nesse sentido, as ações de Marketing convidam os gestores ao exercício analítico e sistemático das variáveis de influência.
Dentre tais ações analíticas sobre as variações ambientais, destacam-se aquelas sobre o ambiente econômico, entendido como a economia em geral, ciclos de negócios, renda dos consumidores e padrões de gastos. O ambiente político-legal, cujas analises incidem sobre as leis, regulamentações e pressões políticas que podem afetar os clientes e mercados. O ambiente social, onde as considerações dão-se sobre as pessoas e seus valores, crenças e comportamentos. O ambiente natural onde se avaliam os recursos naturais disponíveis para a organização ou por ela afetados. Ambiente tecnológico percebido enquanto conhecimento científico, pesquisa, invenções e inovações que resultam em bens e serviços novos ou aperfeiçoados. Ambiente competitivo que integra todas as organizações que podem potencialmente criar valor para um determinado mercado.
Nesta busca por uma relação valorativa e duradoura, as organizações podem valer-se de diversas estratégias que objetivam alcançar os tão desejados clientes e os propósitos organizacionais, dentre elas destaca-se a do Composto Mercadológico: O Produto e os serviços podem ser entendidos como algo oferecido para os clientes com um propósito de troca; o Preço enquanto a quantidade de dinheiro ou recursos que deve ser dada em troca de produtos e serviços; Posição – distribuição enquanto canais logísticos que visam disponibilizar tais produtos – serviços àqueles clientes de interesse; e Promoção enquanto um conjunto de esforços e meios pessoais e impessoais que buscam convencer e lembrar os clientes sobre os produtos e serviços.

Nesta síntese sobre o Marketing, as atenções concentram-se nos esforços e ações promocionais, onde a comunicação assume relevância e expressão. A abordagem aristotélica define o estudo da retórica, vendo a comunicação como a procura de “todos os meios disponíveis de persuasão”. A meta da comunicação é a aceitação de uma idéia ou externalidade.

No século XVIII há a prevalência das faculdades e a escola de pensamento invade a retórica, o dualismo mente e alma oferece duas dimensões sobre a comunicação. A primeira de natureza intelectual ou cognitiva – Mente onde o objetivo é a informação; e a segunda, de natureza emocional – Alma na qual o objetivo é a persuasão e a prevalência de uma vontade ou adoção de uma idéia ou comportamento.

As sociedades de modo geral, são constante e crescentemente induzidas a mudanças de comportamento, onde algumas dessas tentativas são perceptíveis, outras são bem mais sutis e imperceptíveis para a mente consciente. Adicionalmente acalenta-se a ilusão de que individualmente temos total controle de nossos pensamentos, valores e fantasias.


Um dos maiores desafios que atravessa a história incide sobre a natureza da mente humana. As evidências de como o cérebro recebe, processa, armazena, recupera e comunica-se com outros cérebros são incompletas ou hipóteses sob tratamento cientifico.

Há inúmeras e cada vez mais crescentes partículas de dados e informações que são perceptíveis pelos indivíduos através de esforços dirigidos de comunicação, situação esta que dificulta aos diversos grupos sociais concentrarem-se conscientemente sobre diversas dimensões ao mesmo tempo. A percepção consciente é, em geral, fragmentada, pois a mente humana não pode lidar com todas as percepções simultaneamente. A realidade percebida conscientemente é objeto de uma simplificação e abstração da realidade verdadeiramente perceptível. Um reducionismo imposto ao processo perceptivo e interpretativo que coloca em cheque os efetivos e reais entendimentos sobre determinados fenômenos.

A percepção no nível inconsciente é intensa e instantânea, mas extremamente limitada no nível consciente. Frente à evolução de idéias, as novas formas de pensar e raciocinar surgiram como ameaçadoras e até violentas. Instituições religiosas, sociais, políticas, econômicas, científicas e filosóficas lutaram tenazmente para suprir as mudanças e inovações.

O Marketing pode, através de suas ações incisivas de comunicação, associado às vulnerabilidades cognitivas e limitações da racionalidade humana, transformar-se numa poderosa ação abusiva sobre o homem e protagonizada pelo próprio homem. Um viés hobbesiano que induz os indivíduos a se apegarem à ilusão de imaginar que agem e pensam por si mesmos, que são capazes de determinar seus próprios destinos.
O conhecimento, muitas vezes efêmero e volátil em tempos virtuais, invade a percepção humana tanto no nível consciente quanto no inconsciente, especialmente neste último. Uma vez que o inconsciente grupal ou coletivo pode ser programado com o que é chamado de cultura, qualquer mercadoria, idéia, crença, lugar ou pessoa pode ser ofertada e vendida para os níveis conscientes.
Konrad Lorenz (1973) fez um esboço dos oito pecados capitais do homem civilizado, no qual trata das áreas sujeitas a um desastre iminente que foram criadas e sustentadas pelas chamadas civilizações modernas. São estes, a energia nuclear e armas, a superpopulação; destruição ambiental; atrofia de sentimentos; abuso de energias inventivas e inovadoras; degenerescência genética; destruição das tradições e; possibilidade de os homens serem doutrinados.
As tecnologias de doutrinação conhecidas, onde a mídia comercial e institucional ocupa papel decisivo, controlam a cultura e, por meio desta mesma cultura, as construções perceptivas da população em geral. A possibilidade da doutrinação nunca é aparente aos doutrinados, estes não costumam admitir.
Os grupos sociais mais vulneráveis à doutrinação são os que vivem em sociedades tecnológicas manipuladas pela mídia, pois estão condicionados a aceitar sistemas de crenças, comportamentos e valores em mutação. As populações consideradas livres, cultas, inteligentes e civilizadas são, em geral, inconscientes da extensão do quão são manipuladas pela mídia, pelos governos, pelos líderes e pelas instituições.
Quando os indivíduos acreditam que pensam por si mesmos, suas posturas críticas e de proteção se vulnerabilizam. Eles podem ser condicionados em qualquer direção, para qualquer construção da realidade. Enquanto as vítimas verbalizam sua liberdade de escolha, o individualismo, a verdade, os fatos, a realidade até sobre a vontade de Deus, conformam-se inconscientemente aos padrões de consumo, crenças e profecias que se auto-realizam, criados pela mídia, pela força da comunicação, pelo esforço promocional mercadológico.
Desta forma, parece vital para a sobrevivência da multidimensionalidade humana, que os indivíduos aprendam a conhecer, discernir e superar suas vulnerabilidades às pseudo-verdades construídas e manipuladas, mormente instauradas pelos processos comunicativos mercadológicos, através das mídias de alcance massivo, cujos interesses nem sempre evidenciáveis, encontram-se amparados em falácias diversas, francamente protecionistas da unidimensionalidade econômica.

Artigo escrito pelo Prof. Paulo Sérgio de Moura Bastos

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